18/12/2010

"Vida e Morte"

Senhor, eis aqui minha biografia, meu livro de vida...
É documentário, e confesso que é muito difícil escrever a
vida como vós quereis...
É difícil, Senhor, escrevê-la quando não se é escritor, quando nunca se aprendeu tal ofício.
Mas a vida não se aprende:
Toda vida é um romance novo, único no gênero, sempre obra de
primeira mão.
É difícil, Senhor, não poder copiá-lo, pois vós não aceitais
plágios.
É difícil, Senhor, não poder corrigi-la.
Dela não podemos arrancar páginas mal escritas, ou apagar
alguma coisa.
O que escrevi ficará sempre escrito.
O que eu posso é manifestar meu arrependimento, escrevendo páginas melhores.
É difícil, Senhor, seguir este ritmo da vida que me leva
inexoravelmente adiante...
Mas obrigado, Senhor, por retratar-me das páginas passadas
em cada nova página que escrevo.
É difícil, Senhor, ir virando as folhas, dia por dia, na angústia de não saber o dia da entrega do manuscrito...
Mas não seria, Senhor, mais angustioso ainda saber o dia e a
hora?
É difícil, Senhor, não sabermos quantas folhas em branco nos
restam para desenvolver satisfatoriamente o tema...
Um dia qualquer vós me tomareis a caneta das mãos e escrevereis debaixo do meu último rabisco:
Fim.
É difícil, Senhor, não poder reclamar, então:
"Ainda não terminei...", porque há sinfonias inacabadas que são obras primas e há existências longevas que nunca acertaram o tema.
Tive pena do tempo perdido...
Mas, Senhor, não tivestes minha vida, a cada instante, em vossas mãos?

(Rabindranath Tagore)




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